domingo, 21 de outubro de 2018

O que eu aprendi com "90 dias para casar"


"90 dias para casar! é daquele tipo de programa que tu sabe que não deveria perder tempo assistindo, mas quando vê, não consegue desgrudar o olho. Para quem nunca ouviu falar, trata-se de um programa da TLC que mostra casais formados por um(a) norte-americano(a) e um(a) estrangeiro(a) que após se conhecerem e decidirem ficar juntos tem 90 dias para se casar (pois este é o prazo do visto americano concedido a alguém que pretende se casar com um cidadão dos EUA). Há uma variação do programa mostrando os participantes após o casamento também.  Assiste-se pela mera vontade de futricar a vida alheia de pessoas anônimas e muito distantes, eu sei. Somos bombardeados com horas de discussões intermináveis entre os casais, preocupações, embates com as respectivas famílias, choques culturais, estresse com o prazo, planos conflitantes e alguns indivíduos visivelmente apenas interessados no Green Card. No entanto, por detrás de toda a aparente encenação e futilidade que por vezes beira a comédia, em que nos perguntamos “o que essas pessoas estão fazendo?” podemos aprender grandes lições sobre relacionamentos. E é sobre essas lições que eu quero escrever.
Claro, vamos deixar claro que eu assisto o programa do alto da minha solteirice (cada vez mais convicta com a passagem do tempo) e portanto sem as lentes coloridas dos apaixonados, mas com a maturidade de quem já aprendeu um bocado e a certeza de que ainda tem muito a aprender.
Percebemos ao assistir esse tipo de programa o quanto é preciso estar de coração aberto em um relacionamento. O quanto é preciso estar disposto a abrir mão de coisas, mas abrir mão verdadeiramente, sem considerar essa decisão como um fardo que se está carregando em nome daquela pessoa, daquele relacionamento. Sem a exigência de compensações do tipo “eu abri mão de muitas coisas importantes da minha vida para ficar com você, agora você deveria agir como eu quero”. Especialmente quando estamos tratando de culturas e vidas completamente diferentes, é preciso deixar ir muito mais coisas. É difícil aceitar o novo e é difícil ceder. Por mais que se goste da pessoa e que se queira estar com ela, às vezes isso não é suficiente. Às vezes existem outras coisas na nossa vida que importam tanto, mas tanto, que só nos damos conta que não conseguimos renunciar a elas quando somos obrigados a isso. E que o amor daquela pessoa tão desejada talvez não seja suficiente para compensar a dor de tudo que se abdicou. Talvez o “custo de oportunidade” (para usar o jargão dos economistas) seja alto demais e lá no fundo não se esteja verdadeiramente disposto a pagá-lo. Nesse caso, não adianta bater a cabeça pensando em um modo de ficar com a pessoa sem pagar o custo de oportunidade. É o que eu vejo os casais tentando fazer no programa. Eles querem achar um modo de estar com a pessoa sem pagar o custo de oportunidade, sem abrir mão de nada, e quando não conseguem se frustram. Grande erro. Ao fazer isso, ao insistir em algo cujo custo é alto demais, somente nos maltratamos.
Outra lição é que nunca devemos fazer planos esperando que o outro mude para se encaixar neles. As pessoas nem sempre querem mudar e mesmo que queiram, nem sempre conseguem. Mais frustração.
Outro erro fenomenal e incrivelmente comum é que muitos casais aparentemente nunca conversaram sobre o que querem de fato da vida antes de decidir ficar juntos. Parece que a decisão de ficar juntos e a certeza de que “são feitos um para o outro” será suficiente para “que tudo se arranje”. Não. Por mais gostos em comum, por mais afinidade, por mais que se sintam bem e felizes juntos, às vezes as pessoas querem para si coisas diferentes, têm objetivos, metas e valores que não se conversam. Um quer viajar, outro quer comprar uma casa; um quer quatro filhos, outro não; um quer viver na cidade grande, outro num chalé nas montanhas; um quer um grande casamento, outro quer economizar; e por aí vai. De novo, mais possibilidades de que o custo de oportunidade seja alto demais. Se é um ou dois aspectos que se consegue negociar, ok. O problema é que geralmente são coisas grandes demais, são coisas que impactam fundo no modo como aquela pessoa escolheu viver a vida, é a filosofia de vida que ela escolheu para si que está em jogo. E eu acredito sinceramente que mesmo em culturas muito diferentes é possível encontrar pessoas que pensem como nós e que tenham os mesmos valores e metas, formando o “match” perfeito, seja entre amigos ou entre casais românticos. Daí, o processo de incorporar novas coisas e uma nova cultura, é enriquecedor, divertido, leve e extraordinário. Só que se as crenças principais forem diametralmente opostas, o processo de ceder e incorporar talvez seja desgastante demais ou mesmo impossível.
Em alguns casos, apenas aceitar que se viveu uma história incrível e arrebatadora, mas que é melhor que termine é o melhor caminho. Existem muitas pessoas no mundo, a vida está sempre pronta para nos surpreender, basta que tenhamos coragem suficiente para seguir em frente e tudo ficará bem.
Nem tudo é frustração claro. Todas as pessoas que cruzam nossas vidas, das mais diferentes formas, tem o potencial de nos ensinar alguma coisa desde que estejamos suficientemente abertos para isso. Apenas penso que deveríamos ser menos utópicos.

2 comentários:

  1. Grande verdade. É muito importante ter as mesmas metas básicas que a outra pessoa.

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    1. Acho isso fundamental Anônimo. Com metas e objetivos muito diferentes, se torna muito difícil seguir em frente sem conflitos.

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